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Agroindústria sustentável para a agricultura familiar

Agroindústria sustentável para a agricultura familiar

Considera-se como agricultura de pequeno porte o conjunto de produtores rurais que operam nos menores módulos de produção e utilizam mão de obra da família, o que inclui produtores de frutas e verduras, produtores integrados a agroindústrias ou agricultores de assentamentos de reforma agrária. 

A premissa do artigo é que a agricultura de pequeno porte deve ser tratada como um empreendimento empresarial e por isso deve conseguir sobreviver de forma independente nos mercados em que atua. A geração de alimentos para a subsistência pode eventualmente ocorrer como subproduto, mas o foco deve ser a geração de renda ao produtor.

Uma das definições mais tradicionais para o conceito de sustentabilidade de uma atividade é que ela seja economicamente viável, socialmente justa e ambientalmente adequada. 
Ainda que esses critérios sejam interdependentes entre si, a análise pode ser útil como uma primeira aproximação para uma determinada situação, oferecendo informações básicas e revelando as relações entre esses aspectos.

A seguir apresenta-se uma avaliação da agricultura de pequeno porte em geral, para identificar as condições de sustentabilidade desse modo de produção.

O Aspecto Econômico

Uma das principais condições para a viabilidade econômica de um empreendimento agropecuário é a escala mínima de operação em determinado mercado. Este indicador depende, entre outros fatores, das tecnologias disponíveis e das condições de comercialização do produtor. 

A escala é crítica porque em muitas atividades existem economias de escala, isto é, o aumento na produção acumulada reduz os custos unitários (recursos gastos por unidade de produto). Com os produtores não podem influir nos preços em mercados de commodities, a gestão de custos é a única ferramenta para aumentar a margem a ser obtida. 

Em geral, a agricultura familiar menos competitivos em atividades que envolvem economias de escala, como produção de grãos ou pecuária de corte. Por outro lado, eles conseguem gerar margens suficientes na produção de frutas e verduras, que são mais intensivas em mão-de-obra e podem gerar uma receita superior à produção de grãos por unidade de área.

No caso da tecnologia para a agricultura de pequeno porte, deve-se considerar a existência e o acesso a equipamentos adequados a esse público e insumos genéticos de alta qualidade, para maximizar a produtividade do trabalho do agricultor, que é o seu principal ativo. 


A base para essa atualização tecnológica é a capacitação e o acesso a informações, que permitam ao agricultor tomar decisões de produção com menores riscos. 

Em geral os agricultores de pequeno porte não contam com essas condições tecnológicas, sendo que muitos trabalham com soluções ultrapassadas em equipamentos, sementes não certificadas e dificuldades de acesso a serviços de extensão rural ou cursos de capacitação.

Em relação à comercialização, a condição ideal seria a existência de contratos de fornecimento com condições de garantia de preços por parte de processadores ou distribuidores. 

Outro aspecto desejável é a existência de dependência bilateral parcial entre produtores e compradores, que gera incentivos para uma relação duradoura. Na maioria dos casos a agricultura familiar vendem seus produtos em condições de mercado spot, sujeito a grandes oscilações e comportamentos oportunistas dos parceiros nas transações. 

Em geral os processadores evitam o uso de contratos em razão dos riscos de mercado nas relações com os seus distribuidores. As exceções são as cadeias de frangos, suínos e fumo, com contratos de integração entre processadores e os agricultores.

Uma alternativa para ampliar a margem do produtor é a atuação em mercados que operem com preços superiores aos das commodities similares. Nesta categoria estão os produtos certificados por algum atributo funcional, de pureza ou de processo que seja valorizado por um grupo de consumidores.

Alguns exemplos são as regras decorrentes de culturas específicas ou religiões (alimentos kosher, associados ao judaísmo ou abate de animais conforme regras do islamismo), ou certificações decorrentes de regulação pública ou privada (exigências ambientais e sanitárias de determinados mercados ou certificação de orgânicos). 

Nestes casos observa-se uma total compatibilidade entre o modo de produção de agricultura familiar e a integração em cadeias produtivas alimentares com essas características, em razão da maior dependência de mão de obra especializada.

O Aspecto Social

No aspecto social, geralmente considera-se a desigualdade de renda e o acesso a serviços que afetam o bem estar dos agentes. Se a agricultura de pequeno porte consegue sobreviver em determinado mercado, esta condição em si já seria um indicador de que o ambiente competitivo admite algum grau de distribuição de renda. 

Entretanto, deve-se aprofundar a análise para que possa conhecer as perspectivas do produtor conforme as tendências daquele mercado. Em mercados que passam por processos de consolidação e mudanças tecnológicas que favorecem o aumento de escala pode-se esperar que os produtores sejam excluídos em um futuro previsível.

Apesar dos avanços observados no Brasil na área de proteção social por meio de programas de renda mínima e aposentadoria rural, as condições se vida da maioria dos produtores ainda são precárias. 

As necessidades básicas seriam o acesso do produtor e sua família a educação, saúde, cultura, infra-estrutura para moradia e convivência comunitária. O papel do Estado parece fundamental na oferta de serviços e obras destinados a essas funções, ainda que exista um enorme espaço de parcerias com empresas privadas ou entidades sem fins lucrativos. 

Em geral falta aos governos pessoal capacitado e políticas definidas que permitam a elaboração de projetos para a atração de recursos públicos ou privados para essas áreas, em especial em municípios com grandes áreas rurais. O papel dos agentes fora do governo seria facilitar a elaboração de projetos, captação de recursos e contratação de serviços.

A área com maior possibilidade de se obter resultados de curto prazo parece ser a de convivência comunitária, visto que a existência de associações de produtores rurais é bastante disseminada no Brasil. 

Essas entidades, se devidamente apoiadas por parceiros públicos ou privados, podem se transformar em facilitadores para a melhoria das condições sociais dos produtores. 
Por meio delas é possível realizar ações de educação básica ou cursos de capacitação profissional, estratégias coletivas de compras ou comercialização e discussão de iniciativas relacionadas às demais carências sociais.

O Aspecto Ambiental

Com relação ao aspecto ambiental, a agricultura de pequeno porte deveria estar alinhada com as exigências básicas de preservação de recursos naturais, redução do consumo de recursos em geral e reciclagem de materiais ou resíduos. 

Essas categorias são interdependentes entre si e podem oferecer guias para a formulação de políticas públicas e estratégias privadas relacionadas à agricultura de pequeno porte. Em tese, as ações são as mesmas necessárias para a agropecuária em geral.

A preservação de recursos naturais envolve a identificação de ecossistemas na região e levantamento das limitações às atividades agropecuárias, por meio de um zoneamento econômico e ecológico. 

A maioria das prefeituras não possui políticas nessa área, que deveriam ser formuladas de forma integrada ao plano diretor. Em geral faltam instrumentos de ação do setor público, como legislações específicas ou órgãos municipais voltados ao setor agropecuário. 

Uma particularidade da agricultura de pequeno porte relevante para essas ações é a sua maior habilidade em atuar em terrenos com maiores declividade, em razão das dificuldades de mecanização. 

Outra questão relevante é o equilíbrio da ação do Estado entre a fiscalização e a criação de incentivos econômicos para o tipo de ocupação desejada, sendo que esta última tende a ser mais eficiente. 

Os temas a serem tratados seriam a preservação de matas ciliares e nascentes, controle do despejo de resíduos em rios e lagos, prevenção da erosão e controle da emissão de gases de efeito estufa.

A redução no uso de recursos depende das soluções tecnológicas adotadas pelos produtores. A capacitação e o acesso a informações, além dos custos envolvidos, afetam a decisão do produtor quanto às tecnologias de implantação e manejo das culturas ou sistemas de produção animal. 

Qual histórico dos produtores?

O histórico do produtor na atividade com determinadas tecnologia tende a influir em sua propensão a mudar para alternativas de menor impacto ambiental. Existe um grande campo para ações de extensão rural e envolvimento das associações, para criar um movimento coletivo que pode facilitar a mudança de rumos. 

Dentro dos sistemas de produção convencionais, sempre há espaço para otimizar o uso de recursos como combustíveis, água ou insumos químicos, desde que o produtor tenha acesso à fronteira do conhecimento para aquela atividade. 

Outras opções de maior alcance estão disponíveis no campo da produção orgânica, ainda que exijam um investimento maior nos processos de conversão da propriedade, em razão dos períodos de inatividade, além da maior complexidade do manejo.

O tema da reciclagem tem sido tratado com maior ênfase para o lixo urbano, por envolver volumes maiores, alta concentração geográfica dos moradores e a necessidade de eliminar os lixões. Entretanto, a reciclagem deve ser ampliada para as atividades rurais, especialmente na agricultura de pequeno porte. 

A iniciativa rural de maior sucesso nessa área é o programa de reciclagem de embalagens de agrotóxicos conduzido pela INPEV (Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias), com a montagem de um complexo sistema de logística para recolher as embalagens vazias dos agricultores e levar até as plantas de processamento. Iniciativas semelhantes poderiam ser formuladas nas áreas de fertilizantes e lubrificantes, preferencialmente com uma estrutura descentralizada de coleta e processamento, com o apoio de associações de produtores.


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